domingo, janeiro 31, 2010

Amargo.

Era domingo, na televisão passavam os mesmos filmes, e ele assistia um em especial, já sabia quase que de cor as falas e acontecimentos, mas notou que nunca tinha notado e dado valor aos detalhes e o que eles representavam. Claro que num primeiro momento achou que o diretor não tinha pensado em tudo aquilo, e sim nas maioria das vezes não tem mesmo, mas deixou de lado esse pensamento já que era menos importante. Quero ser grande, era o desejo do garoto à máquina cigana, dizia essas palavras do fundo de sua alma, certamente não queria outra coisa em vida, e sim, foi concedido. Ele foge, chora, arruma um emprego, aprende a gostar do mundo, e como gosta. Uma mulher torna as coisas muito mais fáceis e lhe dá a noção exata de como a vida passa a ser, ele descomplica tudo com sorrisos e frases monossilábicas, quão simples ele era.
Claro que o tempo lhe tornava menos infantil, mas não levava o brilho de seu sorriso assim tão fácil. Sentiu o peso de sua decisão, tinha alguém morando junto com ele, era vice presidente de uma empresa, e o mundo explodindo ao ser redor. Explodiria junto? Não, tentou explicar a ela que num primeiro momento nunca acreditaria em tal história, ele por sua vez voltou a máquina cigana e desta vez mais do fundo da alma desejou, quero ser criança. Quando ela chegou já era tarde, ele continuava o mesmo de sempre, porém mais sincero agora, aceitou uma carona para casa, lá ela lhe deu um beijo na testa e ele se foi. Nesta parte do filme que quase tinha perdido espaço para um eventual cochilo ele percebeu que talvez aquele gesto seria o mais importante da história, e também da dele, grandes despedidas sempre se anunciavam da mesma forma.
Péssimo presságio, aquele beijo, verdadeiro, sincero e complicado, e o pior que não apenas sofria com aquilo, já havia o provocado algumas vezes e com ele vinha um amargo ar de incerteza.
Como odiava esse sentimento, por mais que a coisa certa estava sendo feita, toda essa convicção apoiada em pilares fracos e incoerentes, pensando sempre ao longo prazo, perdia o brilho e o frescor de se viver o presente, não se dava conta que era nele que precisava ser pensado, o passado já tinha ido e a futuro não existe, um pleno presente contínuo é o que vivemos, e estamos fadados a essa máxima até o fim de nossos dias, essa é uma certeza, uma das únicas, e mesmo assim não conseguia aceitá-la.

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