sexta-feira, setembro 17, 2010

Conta.

“Não são todas as vezes que penso em você que perco o sono, mas toda vez que perco o sono penso em você”.
Só escreveria aquilo na carta, achava estranho tanto papel para pouco o texto, de outra forma também achava estranho pouco papel para tanto sentimento num envelope amassado entregue por um terceiro.
Não achava legal falar isso pessoalmente, não dava tempo pra ela reagir, ficaria com uma expressão na cara estranha achando que teria que dar uma resposta rápida, ou no mínimo um parecer sobre a situação porque no fim das contas ela não tinha nada a ver com isso. Sim infelizmente era um problema exclusivo seu, claro que ela possuía um pouco de compaixão, não suportava ver que talvez ele ainda tivesse algum pensamento nela, talvez o amor tinha passado mas o sentimento ainda era grande, carinho e afeto não iam embora assim de uma vez.
Lá fora silêncio, de vez em quando era possível escutar um pequeno barulho de sirene, bem distante, nunca era um bom sinal, as luzes piscantes, o som, a velocidade todos alinhados em ajudar a sociedade, por alguns momentos cogitou se uma dessas ambulâncias poderia pegá-lo em casa e resolver tudo, ah se fosse fácil curarem essa ferida, não estava exposta piorava a situação ainda mais, se livrou desses pensamentos com um sorriso bobo e voltou a fitar o envelope, sentiu que não podia enviá-lo, saber que atrapalharia a vida dela de certa forma não era correto.
Por fim achou mais sensato datar, envelopar e guardá-lo, assim quando ele mudasse de ideia ou se ela um dia pudesse ler o papel saberia que naquela quarta não tinha dormido por ela, como se importasse a soma das noites não dormidas para ela, ele tinha perdido a conta.

terça-feira, setembro 14, 2010

Magnitude.

O disco começava mais uma vez a tocar a mesma música, não fazia menção nenhum em trocá-lo, ela gostava tanto daquele som, mesmo não estando ali com ele a trilha continuava.
Parou um instante pra pensar a quanto tempo o mesmo som estava lá, a mais de dois anos, diferente das outras não tinha poucas lembranças físicas consigo, como roupas, brincos e outras coisas, não que colecionasse isso ou gostasse, mas marcavam, ela simplesmente marcava pelo gosto, não só por isso, claro que o sorriso impecável aliada a simplicidade e inteligência não passavam batidos por sua memória. Uma mistura de qualidades e defeitos impressionantes ou como preferia descrever apaixonantes. Gostava de lembrar de Vinícius e Baden, de nada adianta amar uma mulher linda, sem complexos, dúvidas, tristezas, que chora e sente saudade, assim como ele, que de nada sabe efetivamente, o que seria o certo e errado passavam longe de sua racionalidade, ainda não era possível chamá-lo de passional, mas evidentemente cometia momentos dessa magnitude.
A tristeza tinha que ser inerente de todas as relações, simplesmente acabava com todas as que não continham esse fator em questão de dias, um certo medo, aquela sensação de posse nunca pode realmente existir, saber que tem que conquistar a cada dia, e amar de uma maneira diferente a cada olhar. Não enganava ninguém quando sabia que as coisas não iam desta maneira, carinho e perdão não deviam andar de mãos dadas mas pelo menos devia morar ambos na mesma rua.
O problema das pessoas não era falar demais, nem pensar somente em suas próprias futilidades, a verdade é que mais disso devia ocorrer, ver simplesmente o que faz bem pra si e ela e depois, leia nunca, ver o que faz bem para os outros que permaneçam fora dessa relação, entre os abraços, beijos e até mesmo no sexo o bem estar deveria reinar sempre, era culpado em alegar tudo isso e saber que em certas partes do seu passado esqueceu e negligenciou essas máximas que ele mesmo tinha proposto, não se desesperava também, lembrava de um trecho de livro que sempre o fazia sorrir, “Vai ver você tem Alzheimer e não lembrava”

quinta-feira, setembro 09, 2010

Epitáfio.

Ter o que falar é sempre um acontecimento, na maioria dos dias simplesmente guarda tudo para si, e raramente escrevia alguns pensamentos naquele caderno à deriva. Simples dizer que lhe ocorriam idéias a cada minuto e na mesma velocidade e surpresa que lhe ocorriam elas iam embora sem se despedir.
Fantasticamente adotava novos rumos, algumas metas adiadas de outros rumos tomados meses atrás, lógico que no balanço nem tudo era alcançado tampouco lembrado, mas essas pequenas brincadeiras consigo mesmo implicam vontades que ele sente que alguém queria para ele, não tinha mais ninguém ao seu lado, e por várias vezes se perdia, barba imensa, cabelo desarrumado, nenhuma refeição por dia.
Era espetacular a forma que se renovava, não se permitia continuar igual, por mais que fosse metódico com muitas coisas de seu ontem nunca deixava que isso afetasse qualquer possibilidade de um novo hoje, referências continuavam as mesmas, porém ao longo do processo se revestia de novidades, lia diariamente, podia facilmente conversar sobre economia ou fofocas. Mesmo que não prestasse atenção o televisor continuava ligado, achava que por algum modo um tipo de osmose fosse absorver toda a informação presente no aposento.
Não era convencido, pelo contrário se menosprezava, achava que poderia ser no mínimo alguém melhor, pelos corredores ficava fácil notar isso, raramente era lembrado, podia não fazer falta mas efetivamente fazia a diferença.
Procurava não ter buracos em seu passado, mas era inevitável passar por uma vida sem deixar rasgos, o fim não sabia ao certo quando seria, e se efetivamente existia um fim, no maior de seus âmbitos tinha um desejo simples, não ter sido um problema pra ninguém, queria que em seu epitáfio pudesse estar escrito apenas “boas manhãs, noites melhores ainda”.
Seu coração andava mais perdido que a razão, no que via sentido não via amor e vice versa, o bom se é que se pode dizer que exista um lado positivo nisso é que era fácil mascarar todos esses sentimentos, um telefonema não atendido, uma carta não enviada, um encontro não marcado, impressionante como uma simples palavra muda toda a vida de um homem.

quarta-feira, setembro 01, 2010

Sensato.

A verdade é que era péssimo com algumas coisas, declarações e despedidas para ser mais exato, não conseguia fazer nenhuma dessas duas bem. E mesmo se preparando para qualquer uma dessas duas não conseguia nada que julgasse adequado.
O problema das declarações eram óbvios e visíveis, impressionante como sempre escolhia a pior hora para fazê-los, por isso suas declarações era fortemente lembradas ao longo do anos, era direto, simples e por isso eram tão pesadas, não falava sempre, se tinha se declarado mais de cinco vezes em toda sua vida já considerava um número alto, e provavelmente nunca tinha passado desse número mesmo.
Contudo o problema maior residia em outro lugar, as despedidas, não sabia largar, dizia adeus olhando pra trás, e sabia que continuaria fixamente olhando. As pessoas mudavam, vivenciavam experiências novas, ele também, mesmo sem querer entrar nesse emaranhado de emoções. Cautelosamente aceitava as palavras delas e passivamente esboçava algum tipo de reação, por isso sempre se mostrava ineficaz, por dentro sentia vontade de expurgar seu orgulho, e por fora conseguia de certa forma demonstrar isso, claro que no âmbito do desespero isso era a único procedimento que realizava e sim, era claro para si que isso não era o bastante.
Pobre solitário esperava por meses um momento de sonho no qual ela se lembraria dele, entraria em contato, cartas, telefonemas e qualquer outra maneira fria advinda do século XXI, mas nada.
Era de se admirar a quantidade de tempo que gastava de seu dia pensando nela, racionalmente inventava diálogos, previa situações que nunca aconteceria, escrevia tantos textos sobre que ela que cadernos se empilhava pela casa e podia ser usado como bancos. Por mais duro que fosse era sensato talvez ela nunca lesse tudo e se o fizesse provavelmente nunca daria o reconhecimento válido por isso, quem seria o responsável por uma regulamentar essa validade, ninguém, para si não perdia seu tempo fazendo, pelo contrário era mais que um passatempo, era a parte de seu dia que ele encontrava ela, e ali naquele espaço de tempo nada nem ninguém interrompia o encontro. Nem mesmo o tempo.